Nos últimos meses, manchetes têm desenhado a Inteligência Artificial como um vilão prestes a assumir o controle da humanidade. Para alguns, vivemos às portas de um “apocalipse tecnológico” onde máquinas frias e calculistas tomarão nossas decisões, empregos e, quem sabe, até nossas liberdades.
Mas vamos inverter a lógica: Será que é a IA que está “alucinando” sobre o futuro, ou somos nós, humanos, que projetamos nossos medos e inseguranças em uma tecnologia que, no fundo, apenas reflete quem somos e o que decidimos construir?
Eu trago essa provocação em minha primeira coluna, não apenas como empresário e especialista em inteligência artificial, mas como alguém que construiu sua trajetória justamente na interseção entre tecnologia e negócios. Ao longo de mais de três décadas atuando em empresas globais e hoje liderando a LINDA Lifetech no Canadá, aprendi que inovação sempre incomoda. A chegada das máquinas industriais, da internet, do email, da Uber mais recentemente, dentre muitos outros exemplos são uma prova cabal disso. Mas quero criar um momento de reflexão com essa leitura e trazer luz à realidade do momento atual em que vivemos.
O mito do domínio das máquinas
A IA não pensa sozinha, não deseja poder e não conspira contra nós. Ela é uma ferramenta obviamente sofisticada e complexa, mas moldada por dados, algoritmos e, sobretudo, pela intenção humana. Nós é que dizemos para a IA o que é pra ela fazer. Ela é programada. No final do dia é o famoso zero ou um. Quando jornais ou influenciadores dizem que “as máquinas vão dominar o mundo”, o que vemos não é uma previsão científica, mas sim uma narrativa humana. Aliás, narrativa essa tão imperfeita, subjetiva e enviesada quanto alucinações de uma IA mal treinada.
É curioso notar que pedem (corretamente) para não “confiarmos cegamente” em sistemas de IA, mas raramente aplicamos o mesmo ceticismo ao que nós, humanos, falamos sobre ela. Quem está exagerando aqui?
Na ciência da computação, chamamos de alucinação quando um modelo de IA inventa informações. Mas e quando humanos distorcem fatos, exageram riscos e criam teorias conspiratórias sobre máquinas? Isso também é uma forma de alucinação, com a diferença de que a IA não tem agenda própria, nós, sim e essa agenda própria geralmente é feita pra nos proteger, seja à nós mesmos ou à um grupo específico.
Por trás do sensacionalismo, há interesses políticos, econômicos e até midiáticos. “O perigo iminente das máquinas” dá manchete, gera cliques e atrai audiência, mas dificilmente ajuda líderes empresariais e a sociedade a entenderem como, de fato, essa tecnologia pode transformar setores, aumentar eficiência e abrir novas oportunidades de crescimento.
É aí que a lucidez humana precisa entrar em ação e garantir que olhemos para essa tecnologia com o cuidado que ela exige, mas acima de tudo com a responsabilidade e a clareza que ela demanda. Esse é o papel de um líder na era da Inteligência Artificial.
Enquanto discutimos se os robôs vão nos dominar, perdemos tempo precioso para olhar onde a IA já está nos servindo hoje:
Na saúde, a IA está antecipando diagnósticos e salvando vidas. No varejo, está personalizando experiências de consumo e aumentando vendas. No campo, ela está prevendo safras, otimizando recursos naturais e aumentando o lucro. Já na educação, está democratizando acesso ao conhecimento e otimizando jornadas administrativas para desafogar professores que passam a ter mais tempo com os alunos.
A verdadeira ameaça não é a IA em si, mas a nossa inércia diante de seu potencial. O risco está em ficarmos presos às manchetes do medo, enquanto outras sociedades avançam rapidamente ao adotar, regular e usar a IA de forma estratégica.
No mundo corporativo, isso significa ter uma visão estratégica clara que funcione como um farol para a adoção da IA. Empresas que mergulham em modismos ou implementam tecnologia sem propósito tendem a desperdiçar recursos. Já aquelas que alinham a IA ao seu modelo de negócios, cultura organizacional e objetivos de longo prazo conseguem transformar o hype em vantagem competitiva.
E o MIT já nos apresentou a diferença entre as empresas que investem sem clareza e as que investem com clareza. 95% dos investimentos corporativos em IA Generativa estão dando retorno zero e cabe a nós líderes mudarmos esse cenário imediatamente.
E fica aqui a minha reflexão final:
“Não acredite em tudo o que um humano diz” não é uma provocação contra a nossa espécie, mas um convite à lucidez. Assim como ensinamos máquinas a diferenciar dados confiáveis de falsos, também precisamos ensinar a nós mesmos a filtrar discursos alarmistas de análises fundamentadas.
O futuro não será dominado por máquinas nem por teorias catastróficas. Ele será moldado pela qualidade e pela velocidade das nossas decisões. Os líderes que entenderem isso cedo terão uma vantagem competitiva inestimável.